Não Tropece na Língua
Número: 224
Data: 09/03/2016
Título: PROFA., ANTES DE MAIS NADA, NA VERDADE É CORRETO
--- Gostaria de saber algo a respeito da expressão ‘antes de mais nada’, que usualmente é utilizada na abertura de discursos, pois na minha opinião, a expressão em si nada significa. Gostaria de saber se é correta essa utilização e até, se possível, a origem dessa expressão. J.C.A., Florianópolis/SC
Para começar, a língua não se comporta racionalmente como nós; ela tem sua lógica própria. Por isso não adianta falar em expressões vazias, que não têm sentido, não dizem nada. Tudo tem sentido. Os falantes vão criando expressões e modos de dizer que atendam às suas necessidades de comunicação. Eu poderia ter iniciado este parágrafo, além do modo como o fiz, com Primeiramente, Em primeiro lugar, Antes de tudo, Primeiro que tudo, ou mesmo o mal falado Antes de mais nada – sem preconceito.
Se não é possível precisar a sua origem, é importante destacar que “antes de mais nada” é uma locução adverbial antiga na língua portuguesa. O escritor luso Camilo Castelo Branco já a empregava nos idos de 1800:
“Vamos ver quem geme antes de mais nada.”
E também já foi utilizada por Rui Barbosa, na Réplica, em 1902:
“Ora, antes de mais nada, se essa dissonância fosse inevitável, eu não a teria notado.”
Assim, não é preciso mudar a expressão quando o corretor ortográfico a grifa de verde e sugere “antes de tudo / antes de qualquer coisa”. Pensando bem, esta última não parece pior?
--- Na verdade: fenômeno atual ou vício? No ano de 1993 escutei e prestei a atenção pela primeira vez na expressão “na verdade” falada por uma amiga residente em Brasília. A data me é precisa exatamente porque considerei aquilo estranho aos meus ouvidos. Atualmente, se prestarmos atenção, o na verdade é usado em mais da metade das respostas dadas a repórteres ou entrevistadores, na TV. E é usado com enorme frequência em diálogos informais do cotidiano, particularmente acadêmico. Minha pergunta é a seguinte: trata-se essa expressão de um vício disseminado por algum ‘vírus linguístico’, que faz uma imensa parcela da população usá-lo para impor-se perante seus interlocutores? F. S., Curitiba/PR
Além da locução comentada no primeiro item (antes de mais nada), o livro “Locuções Adverbiais”, de Schwab A. (UFPar, 1985), também contempla a locução na verdade, que quer dizer “realmente, certamente, de certo, por certo” e já foi usada até por Machado de Assis no romance D. Casmurro:
“Na verdade, Capitu ia crescendo às carreiras.”
O fato é que não se pode fugir dessa locução quando se trata de linguagem coloquial. É uma expressão de reforço, usual e lícita. Agora, se as pessoas atualmente exageram na sua aplicação, aí sim pode ser um caso para os psicólogos, e não para os linguistas.
--- Estão dizendo que não se usa a abreviatura Profa. para professora. Todo mundo, na universidade, é Prof. E aí, como é que eu faço para saber se é ele ou ela, um autor ou autora, quando me deparo com um trabalho escrito por Prof. Enéas, Prof. Darci, Prof. Roseli, Prof. Alcione? JU, Florianópolis/SC
Para quem lê não há solução, a não ser que as pessoas passem realmente a usar a abreviatura indicativa de feminino quando se referirem a uma mulher: Profa. Enéas, Profa. Darci, Profa. Roseli, Profa. Alcione. Aliás, o bom e correto é usar esta abreviatura para todas as mulheres professoras, podendo o a final ser elevado: Profa. Maike, Profª Helena, Profª Nora Silva.