Não Tropece na Língua
Número: 282
Data: 10/05/2017
Título: CITAÇÃO DE PARÁGRAFOS E SÉCULO 21
--- Sempre vi nos livros que, em grandes textos entre aspas, quando há a necessidade de se mudar de parágrafo, isto se faz sem fechar aspas no parágrafo que termina, mas abrindo aspas no novo parágrafo. Sempre achei que esta era a norma (aliás, uma norma inteligente, deixa a leitura mais clara), mas agora, vejo cada vez mais textos em revistas e jornais nos quais não se usa esse procedimento, colocando aspas apenas no início e no fim do texto, tenha ele quantos parágrafos tiver. Qual é a forma correta, se é que há uma? Jayme Serva, São Paulo/SP
Sim, era essa a orientação que se recebia. Em 1960 ensinava o mestre Antenor Nascentes que, na transcrição de um texto, “se o trecho contiver diversos parágrafos, as aspas de abertura deverão estar antes da primeira palavra de cada parágrafo e as de fechamento depois da última palavra do derradeiro parágrafo”.
Cito um exemplo de Celso Luft sobre aspas e parágrafo encontrado no Grande Manual de Ortografia Globo:
“Disse D. Antonio de Macedo Costa:
“Restaurar moral e religiosamente o Brasil!
“Esta é a obra das obras; a obra essencial, a obra fundamental sobre que repousa a estabilidade do trono e o futuro da nossa sociedade.”
O uso do computador, todavia, mudou essa prática. A facilidade trazida pela informática na troca de fonte, tamanho e espaço entre linhas permite substituir essa marcação com aspas por outras modalidades de destaque. Assim, se a transcrição longa (de mais de cinco linhas, com um ou mais parágrafos) estiver em recuo da margem, ou em letra diferente, ou em espaço menor, ou for destacada em itálico, o leitor já sabe que está lendo um trecho citado ainda que não haja aspas nem mesmo no início da primeira linha. Agora, é preciso haver alguma diferença visual, caso contrário é bom colocar as aspas no início de cada parágrafo, como explicitado acima.
--- É correto grafar século, opcionalmente, em numerais (século 20) ou em romanos (século XX)? Roberto R. de Carvalho, Salvador/BA
Sabe-se que os tempos mudam, e consequentemente os costumes. Mesmo os ortográficos. E nesse sentido a imprensa acaba dando as ordens. Resistimos por um período mas vamos nos deixando levar pelas alterações gráficas que encontramos nos meios de comunicação mais poderosos. Uma delas é a troca dos algarismos romanos pelos arábicos na designação numérica de títulos papais e da nobreza.
Antes, para ser correta, essa grafia tinha que ser em algarismo romano: Papa João XXIII, Papa Paulo VI, Papa Bento XVI, D. Pedro I, D. Pedro II. Igualmente no caso de século: séc. XX, séc. XVIII. Mas foi entrarmos num século com três dígitos romanos em plena era da informática para se revelar a tendência à troca facilitadora. Convenhamos que é muito mais fácil ler e digitar séc. 21 do que séc. XXI.
Imagino que seja este o objetivo dos jornais ao utilizar o numeral arábico: permitir uma leitura rápida a muitos outros brasileiros além dos tradicionalmente cultos (quantas escolas ainda ensinam os algarismos romanos?). Contudo, ainda me surpreendo quando vejo esta referência ao nosso imperador, como escrito em jornal catarinense (10.7.2005):
D. Pedro 2º e D. Tereza Cristina visitaram as águas termais [de Santo Amaro da Imperatriz/SC] em 1845.
No caso dos papas, já ficou mais fácil aceitar a inovação, de tão comum. Isso não quer dizer que não continuem em vigor as formas tradicionais de escrita. Temos a convivência de ambas:
O papa João Paulo 2º gostava de repetir que o mundo precisa de muitos santos.
Às sete horas da noite, o Papa Bento XVI celebrou missa na praça em frente à Basílica de São João Latrão.