Não Tropece na Língua
Número: 148
Data: 26/08/2020
Título: NENHUM, QUALQUER, DE MODO ALGUM, DE MODO NENHUM
--- Gostaria de saber quando usar nenhum e nem um. Sônia Maria Lins, Rio de Janeiro/RJ
O pronome indefinido nenhum é a junção ou aglutinação de nem + um, havendo entre as duas formas, segundo Napoleão Mendes de Almeida, “diferença de energia de expressão” (Dicionário de Questões Vernáculas, SP: Caminho Suave, 1981:203). Continua ele:
“Dizendo: ‘Nenhum homem é capaz de fazer isso’ – demonstraremos, simplesmente, não haver, dentre os homens, quem possa fazer determinada coisa. Dizendo, porém: ‘Nem um homem é capaz de fazer isso’, indicaremos, explicitamente, não haver nem mesmo um homem, como se disséssemos não ser capaz disso não somente uma mulher mas nem sequer um homem. (...) ‘Nem um centavo tenho’ ( =Nem ao menos um centavo tenho – Não tenho um único centavo) – é expressão mais forte, mais expressiva que esta: ‘Nenhum centavo tenho’ ( =Tenho dinheiro, mas não tenho uma moeda de um centavo)”.
O normal, o mais comum é usar a forma contraída: Não consegui nenhum real. A forma analítica nem um se reserva para situações de ênfase, tanto é que neste caso se pode inserir um termo de apoio como “mesmo” ou “só”: Não conseguiu nem um real = Não conseguiu nem mesmo um real = Não conseguiu nem um só real.
Em resumo, podemos registrar que nenhum/a é usado com os seguintes significados:
1. Nem um/a (só): Nenhuma decisão da Conferência da Saúde do Trabalhador foi implementada.
2. Qualquer: Mais que em nenhum outro momento da história, a humanidade enfrenta encruzilhadas e desafios. Tomou o remédio mas não sentiu nenhuma melhora.
3. Nulo; inexistente: Considera-se poeta de nenhuma importância.
4. Nenhuma pessoa; ninguém: Convidaram todos os alunos, mas nenhum foi.
Tendo em vista as provas de concursos, que muitas vezes se apegam ao incomum e extraordinário, devo chamar a atenção para as formas flexionadas. Além do feminino nenhuma, existem os plurais nenhuns, nenhumas, que são praticamente desusados na linguagem de hoje. Por exemplo, em vez de “não lhe deu nenhumas garantias”, costuma-se dizer simplesmente “não lhe deu garantias”, ou então “não lhe deu nenhuma garantia”.
Lembra o Dic. Aurélio que esse pronome “às vezes aparece posposto ao substantivo: ‘Serviço nenhum José de Arimateia refugava’ (...)”.
A propósito dessa colocação, vejamos o uso de nenhum e algum em orações negativas, nas quais estes termos servem de reforço:
Não tenho orgulho algum disso.
Não tenho orgulho nenhum disso.
Não tenho nenhum orgulho disso.
Não vamos a nenhum lugar.
Não vamos a lugar nenhum.
Não vamos a lugar algum.
Observe que algum corresponde a nenhum quando posposto ao substantivo em frase onde apareça uma partícula negativa ou a preposição sem (p. ex.: Sem problema algum! Sem dúvida alguma!).
Outro detalhe: os gramáticos normativistas não admitem o uso de qualquer (indeterminação) com o significado de nenhum (negação). Apesar da “proibição”, já se tornou um hábito as pessoas falarem, por exemplo, “não vamos a qualquer lugar / não tenho qualquer problema / fez a conta sem qualquer erro” com o sentido negativo de “nenhum lugar, nenhum problema, nenhum erro”. Todavia, num texto escrito formal é sempre recomendável observar a norma.