Não Tropece na Língua
Número: 030
Data: 23/05/2018
Título: ESTE, ESSE OU AQUELE (2)
Emprego dos pronomes demonstrativos em relação ao DISCURSO:
. entre dois ou três fatos citados:
o primeiro que foi citado > AQUELE
o do meio > ESSE
o último citado > ESTE
Houve uma guerra no mar entre corsários de França e Inglaterra: estes [desnecessário dizer que são os corsários ingleses] venceram aqueles.
Música de câmara e ópera são as suas preferidas: esta, porque mexe com seus sentimentos; aquela, pelos efeitos relaxantes.
UMA QUESTÃO DE CLAREZA
É bastante comum o uso de este/esta no lugar do pronome pessoal ele/ela como referência à coisa mais presente, mais à mão, mais próxima (embora já apresentada), quando na oração anterior aparecem outros substantivos que poderiam ser referidos pelo mesmo pronome pessoal, o que poderia confundir o leitor. Exemplos:
Quando o rei D. João V faleceu e D. José ocupou o trono, este recorreu a Sebastião José para ser Ministro da Guerra e dos Negócios Estrangeiros.
Dois antecedentes masculinos. Com ele no lugar de este, à primeira vista, sem pensar, poderíamos pensar ter D. João V, e não D. José, nomeado Sebastião José (o Marquês de Pombal) ministro.
Macpherson dirige sua crítica a Rawls quando este admite serem os princípios éticos da justiça econômica capazes de regular o mercado.
Pelo demonstrativo, fica claro que Rawls é o sujeito de admite, e não Macpherson.
Há necessidade de romper com o conhecimento do passado e, em consequência dessa ruptura, torna-se inevitável a retificação da linguagem para que esta se torne adequada à nova ciência.
O pronome “ela” no lugar de “esta” não nos permitiria saber se o autor estava fazendo referência a linguagem, retificação ou ruptura.
Quando os substantivos antecedentes pertencerem a número e gênero diversos ou quando não houver ambiguidade na frase, é melhor, mais adequado e correto usar o pronome pessoal ele(s) ou ela(s) em vez do demonstrativo:
Bachelard, no que se refere à necessidade de superação de obstáculos, alerta que eles não têm origem externa ao ato de conhecer. [e não “estes”]
Essa concepção de ensino não constitui novidade, a ponto de certos autores aludirem a ela como um aforismo. [desnecessário dizer “esta”]
O metal, aquecendo-se progressivamente com o aumento da corrente, deve derreter quando ela ultrapassar 10% de um valor prescrito.
Mais um detalhe: ao se referirem a elemento anterior mais próximo, os pronomes este(s) / esta(s) são encontrados também em combinação com o termo último:
Preocupa-se o autor com a escrita como processo, e não como literatura ou como texto a ser linguisticamente analisado. Aliás, neste último caso não se leva em consideração o tipo de processo.
Cabe mencionar ainda que no Brasil não há demasiado rigor no uso dos demonstrativos (a não ser na questão de LUGAR e TEMPO), porque no aspecto de localização do DISCURSO muitas vezes a distinção entre o que é mencionado anteriormente e o que é lugar/tempo é pouco perceptível. Por exemplo, num texto em que vários artigos de lei estão sendo citados, o autor pode preferir dizer este artigo ao se referir a um já citado (quando então usaria esse artigo) porque ele está justamente tratando “deste último”, do mais próximo (lugar), do que está presente naquele momento (tempo).
Também no caso de uma tese em que se fala de uma empresa ou pessoas pesquisadas, pode-se escrever “esta empresa” ou “estas alunas” mesmo tendo sido elas mencionadas antes – no parágrafo anterior, digamos –, desde que se pense nelas como “as alunas tratadas aqui, nesta pesquisa”, ou “a empresa de que se fala neste trabalho, aqui e agora”. São casos em que a escolha depende do ponto de vista de quem escreve.