Acordo Ortográfico
A língua portuguesa está em constante movimento. A grafia das palavras segue uma convenção, a qual em alguns casos se altera no tempo e no espaço geográfico de uso. A mudança linguística é movida por duas forças distintas: uma procede da língua mesma, é inerente à sua lógica interna; a outra procede da comunidade linguística, das condições sócio-históricas em que é produzida.
Nesse sentido, a nova reforma ortográfica, fruto de acordo assinado em 1990 pelos países de língua portuguesa – Portugal, Moçambique, Guiné-Bissau, Angola, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Brasil –, tem por fim promover uma unificação do português escrito. O Brasil é o primeiro a implementar a reforma. Para os brasileiros, as mudanças se refletem, essencialmente, no uso do trema e do hífen e nas regras de acentuação.
ACORDO ORTOGRÁFICO DA LÍNGUA PORTUGUESA | ||
Tabela organizada por Maria Tereza de Queiroz Piacentini* | ||
Decreto nº 6.583, de 29.9.2008 | ||
Na coluna à esquerda estão expostas as regras do Acordo, a maioria ipsis litteris; à direita, em itálico, exemplos extraídos do Acordo, e em redondo, exemplos nossos. | ||
1 | O alfabeto da língua portuguesa é formado por 26 letras, cada uma delas com uma forma minúscula e outra maiúscula: | a A (á) |
b B (bê) etc. | ||
2 | As letras k, w e y usam-se nos seguintes casos especiais: | |
a) Em antropônimos (nomes de pessoas) e topônimos (nomes de lugares) originários de outras línguas e derivados | » Franklin, frankliniano; Kant, kantismo; Darwin, darwinismo; Wagner, wagneriano; Byron, byroniano; Taylor, taylorista; Kuwait, kuwaitiano; Malawi, malawiano. | |
b) Em siglas, símbolos e mesmo em palavras adotadas como unidades de medida de curso internacional: | » TWA, KLM; K-potássio, W - oeste (West); kg -quilograma, km - quilômetro, kW-kilowatt, yd-jarda (yard); Watt | |
3 | Verbos em -iar, ligados a substantivos com as terminações átonas -ia ou -io, admitem variantes na conjugação: | negoceio ou negocio (cf. negócio); premeio ou premio (cf. prêmio); etc. |
Outros: remediar (cf. remédio)- intermediar - agenciar - comerciar | ||
4 | Em algumas (poucas) palavras oxítonas terminadas em E tônico, geralmente provenientes do francês, esta vogal admite tanto o acento agudo como o acento circunflexo: | bebé ou bebê, bidé ou bidê, canapé ou canapê, caraté ou caratê, croché ou crochê, guiché ou guichê, matiné ou matinê, nené ou nenê, puré ou purê, rapé ou rapê – |
balé ou balê | ||
Também: cocó, judo e metro | ||
5 | Não se usa o acento agudo nos ditongos abertos "ei" e "oi" das palavras paroxítonas: | assembleia, boleia, estreia, europeia, ideia, Coreia, proteico |
Obs.: Nas oxítonas e nos monossílabos tônicos o acento permanece: constrói, herói, dói, papéis, coronéis. | eu apoio, ele apoia, boia, heroico, introito, jiboia, paranoia | |
6 | Não se usa acento circunflexo nas formas verbais paroxítonas que têm e tônico oral fechado em hiato com terminação -em da 3ª pessoa do plural do presente do indicativo ou subjuntivo: | [principais verbos: dar, crer, ler, ver] |
deem, creem, descreem, leem, releem, veem, interveem, preveem, desdeem (de desdenhar) | ||
7 | Não se usa o acento circunflexo nas palavras terminadas no hiato "oo": | substs.: enjoo, voo, zoo |
verbos:<destoo, entoo, povoo
“Eu magoo, mas também perdoo.” |
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8 | Não se usa o acento agudo nas paroxítonas com "i" e "u" tônicos quando precedidos de ditongo: | feiura - baiuca - boiuno |
cheiinho - saiinha | ||
Cp. seriíssimo, feiíssimo (proparoxítonas) | ||
9 | Os verbos arguir e redarguir prescindem do acento agudo na vogal tônica grafada u nas formas rizotônicas: | arguo, arguis, argui, arguem; argua, arguas, argua, arguam |
Mas: ontem arguí um candidato. [mesma regra de “atraí, construí, influí”] | ||
10 | Os verbos aguar, apaniguar, apaziguar, apropinquar, averiguar, desaguar, enxaguar, obliquar, delinquir e afins, podem ser escritos de duas formas: | averiguo,averigua, averiguam; averigue; enxaguo, enxagua, enxaguam; enxague, enxague, enxaguem, etc.; delinquo, delinqui, delinquem; |
» com a vogal u tônica, porém sem acento gráfico | OU: averíguo, averíguas, averígua, averíguam; averígue, averígues, averígue, averíguem; enxáguo, enxáguas, enxágua, enxáguam; enxágue, enxágues, enxágue | |
» com as vogais a ou i radicais acentuadas fônica e graficamente | ||
11 | Acento diferencial | Assim, deixam de se distinguir pelo acento gráfico: para (á), flexão de parar, e para, preposição; pela(s) (é), substantivo e flexão de pelar, e pela(s), combinação de per e la(s); pelo (é), flexão de pelar, pelo(s) (é), substantivo ou combinação de per e lo(s); polo(s) (ó), substantivo, e polo(s), combinação antiga e popular de por e lo(s) |
Não se usará mais
acento em para, pela, polo, pelo, pera. |
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Continua em: pôr e pôde | ||
Facultativo: fôrma | ||
12 | O trema, sinal de diérese, é inteiramente suprimido em palavras portuguesas ou aportuguesadas. Conserva-se apenas em nomes próprios estrangeiros e seus derivados: | hübneriano, Hübner, mülleriano, Müller |
Anhangüera [tupi, “diabo velho”] | ||
Barigüi [tupi, “mosquito”] | ||
13 | Emprega-se o hífen nas palavras compostas por justaposição que não contêm formas de ligação e cujos elementos, de natureza nominal, adjetival, numeral ou verbal, constituem uma unidade sintagmática e semântica e mantêm acento próprio: | anos-luz, arco-íris, decreto-lei, médico-cirurgião, tio-avô, turma-piloto; amor-perfeito, guarda-noturno, mato-grossense, porto-alegrense, sul-africano; afro-asiático, azul-escuro, luso-brasileiro, primeiro-ministro, segunda-feira; conta-gotas, guarda-chuva |
Obs. 1: Certos compostos, em relação aos quais se perdeu, em certa medida, a noção de composição, grafam-se aglutinadamente: | girassol, madressilva, mandachuva, pontapé, paraquedas, paraquedista, etc. | |
Mas: para-brisa, para-choque, para-lama, para-raios, para-sol | ||
Obs. 2: As palavras compostas que contêm formas de ligação, como preposições, perdem o hífen: | água de coco, café da manhã, cor de mel, [o] dia a dia, [um] deus nos acuda, dona de casa, mão de obra, pé de moleque, pôr do sol. | |
Exceções: água-de-colônia, ao deus-dará, à queima-roupa, arco-da-velha, cor-de-rosa, mais-que-perfeito, pé-de-meia. | ||
14 | Emprega-se o hífen nas palavras compostas que designam espécies botânicas e zoológicas (com ou sem formas de ligação): | couve-flor, erva-doce, feijão-verde; ervilha-de-cheiro, bem-me-quer, formiga-branca; andorinha-do-mar, andorinha-grande, cobra-d’água, bem-te-vi |
15 | Emprega-se o hífen nos compostos com bem e mal quando o segundo elemento começa por vogal ou h e entre eles há unidade sintagmática e semântica. Quando o segundo elemento inicia por consoante, a regra geral é ocorrer a junção. No entanto, o advérbio bem, ao contrário de mal, pode não se aglutinar com o segundo elemento. | bem-aventurado, bem-estar,
bem-humorado; mal-afortunado, mal-estar, mal-humorado; bem-criado (malcriado), bem-falante (malfalante), bem-mandado,
bem-nascido (malnascido)
, bem-soante (malsoante),
bem-visto (malvisto). Mas: benfazejo, benfeito, benfeitor, benquerença |
16 | Emprega-se o hífen nos compostos com os elementos além, aquém, recém e sem: | além-Atlântico, além-fronteiras; aquém-Pireneus; recém-casado, recém-nascido; sem-cerimônia, sem-número, sem-vergonha |
17 | Emprega-se o hífen com os prefixos hiper, inter, super quando combinados com elementos iniciados por R: | hiper-requintado, inter-resistente, super-revista hiper-raivoso, inter-regional, super-rico |
Quanto a sub, mantêm-se as regras: | ||
» hífen para separar as letras B do prefixo e da palavra-base: | sub-base, sub-bibliotecário, sub-bosque | |
» hífen antes de R: | sub-racial, sub-ramo, sub-regional, sub-reitor, sub-relator, sub-reptício, sub-rogar | |
» hífen quando o segundo elemento inicia por H (conforme item seguinte, ex. sub-hepático): | sub-hidroclorato, sub-hirsuto, sub-horizonte | |
Contudo, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa - VOLP 2009 traz subumanidade e subumano além de sub-humanidade e sub-humano, não tendo exemplificado o uso com habitação (nem sub-habitação, nem subabitação). | ||
18 | Emprega-se o hífen nas formações com prefixo em que o segundo elemento começa por H: | anti-higiênico, extra-humano, pré-história, sub-hepático, super-homem, ultra-hiperbólico; geo-história, neo-helênico, semi-hospitalar |
19 | Emprega-se o hífen nas formações em que o prefixo ou pseudoprefixo termina na mesma vogal com que se inicia o segundo elemento: | anti-ibérico, contra-almirante, infra-axilar, supra-auricular; arqui-irmandade, auto-observação, eletro-ótica, micro-onda, semi-interno – |
micro-organismo ou microrganismo | ||
O prefixo RE foge à regra, ou seja, mantém-se a grafia de dois “ee” juntos, sem hífen: | reeducar, reerguer, reelaborar, reestruturar | |
20 | Não se usa hífen nas formações em que o prefixo ou falso prefixo termina em vogal e o segundo elemento começa por R ou S, devendo estas consoantes duplicar-se: | antirreligioso, antissemita, contrarregra, contrassenha, cosseno, extrarregular, infrassom, minissaia, biorritmo, hiossatélite eletrossiderurgia, microssistema |
21 | Emprega-se o hífen para ligar duas ou mais palavras que ocasionalmente se combinam, formando não propriamente vocábulos, mas encadeamentos vocabulares: | a divisa Liberdade-Igualdade-Fraternidade, a ponte Rio-Niterói, o percurso Lisboa-Coimbra-Porto, a ligação Angola-Moçambique, o eixo Rio-São Paulo, a dicotomia teoria-prática |
22 | Nas formações com o prefixo co-, este aglutina-se “em geral” com o segundo elemento mesmo quando iniciado por o: | coobrigação, coocupante, coordenar, cooperação, cooperar, etc. |
Não mudaram: coabitar, coestaduano, coeternidade | ||
Obs.: O VOLP 2009 traz coerdeiro. Já a Base XVI, 1º, a, do Acordo exemplifica o uso de hífen quando o segundo elemento inicia por h com a palavra co-herdeiro. | Grafia atual (em alguns casos, causando problema de identificação): coautor, coacusado, coadquirir, coedição, coeducar, coemitente, coendossar, coerdar, cofator, cofiador, cogestão, copartícipe, corredator, corresponsável, corréu, corré, cossenhor, cosseno, cossignatário | |
Novas palavras no VOLP, entre outras: coaluno, coassociação, cointeresse, cossísmico | ||
23 | Emprega-se o hífen nas formações com os prefixos circum- e pan- quando o segundo elemento começa por vogal, m, n, ou h: | circum-escolar, circum-murado, circum-navegação; pan-africano, pan-negritude |
circum-hospitalar; pan-americano, pan-helênico, pan-ótico, pan-mítico, pan-naturalista. Mas: O Panóptico [livro] e um panótico/panóptico [por tradição] | ||
24 | A letra minúscula inicial é usada: | |
a) Ordinariamente, em todos os vocábulos da língua nos usos correntes. | segunda-feira etc. | |
b) Nos nomes dos dias, meses, estações do ano. | janeiro, fevereiro, verão, outono etc. | |
c) Nos usos de fulano, sicrano, beltrano. | ||
d) Nos pontos cardeais (mas não nas suas abreviaturas): | norte, sul (mas: SW sudoeste) | |
25 | A letra maiúscula inicial é usada: nos antropônimos e topônimos; nomes de seres antropomorfizados ou mitológicos; nos nomes de instituições; nos nomes de festas e festividades; nos títulos de periódicos; nos pontos cardeais ou equivalentes quando empregados absolutamente; em siglas, símbolos ou abreviaturas internacionais ou nacionalmente reguladas com maiúsculas, iniciais ou mediais ou finais ou totalmente em maiúsculas: | João, Branca de Neve |
Biguaçu | ||
Netuno | ||
Páscoa, Carnaval, Quarta-Feira de Cinzas | ||
Diário Catarinense |
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Nordeste, por nordeste do Brasil, Norte, por norte de Portugal, Ocidente, por ocidente europeu, Oriente, por oriente asiático | ||
ONU, NATO, H2O, Sr., V. Exª. | ||
26 | Uso facultativo das maiúsculas ou minúsculas: | |
a) nos bibliônimos (nomes de livros) – afora a primeira inicial maiúscula; | a) Casos e ocasos raros no Brasil ou Casos e Ocasos Raros no Brasil | |
b) em palavras usadas reverencialmente, formas de tratamento ou hagiônimos (nomes religiosos); | b) senhor doutor Joaquim da Silva, bacharel/ Bacharel Mário Silva, Vossa Senhoria ou vossa senhoria, papa ou Papa Bento XVI; santa ou Santa Inês | |
c) nos nomes que designam domínios do saber, cursos e disciplinas; | c) aritmética/ Aritmética, ciências/Ciências | |
d) em início de versos; em categorizações de logradouros públicos, templos e edifícios | d) rua ou Rua da Liberdade, largo ou Largo dos Leões, igreja ou Igreja do Bonfim, templo ou Templo do Apostolado, palácio ou Palácio da Cultura, edifício/ Edifício X | |
27 | A divisão silábica em regra se faz pela soletração e por isso não se tem de atender aos elementos constitutivos dos vocábulos segundo a etimologia. | » a-ba-de, bru-ma, ca-cho, ma-lha, ó-xi-do, ro-xo, te-me-se, bi-sa-vó, de-sa-pa-re-cer, hi-pe-ra-cús-ti-co, i-ná-bil, su-bo-cu-lar, su-pe-rá-ci-do; am-bi-ção, de-sen-ga-nar, en-xa-me,ca-dei-ra, flu-iu, cam-brai-a, tran-so-ce-a-no, vo-os, prê-mio/prê-mi-o |
Exceções: (prefixos em b ou d antes de L ou R): como ab- legação [ablegação], ad- ligar [adligar], sub- lunar [sublunar] – sub-rei-tor, sub-li-nhar ou su-bli-nhar | ab-di-car, op-tar, sub-por, ab-so-lu-to, ad-je-ti-vo, af-ta, íp-si-lon, ob-vi-ar; des-cer, nas-cer, res-ci-são; ac-ne, ad-mi-ro, di-a-frag-ma, ét-ni-co, rit-mo, sub-me-ter, am-né-si:a; cor-ro-er; as-sei-o, bis-se-cu-lar; subs-cre-ver; co-or-de-nar | |
28 | Assinaturas e firmas, incluindo cidades | |
Para ressalva de direitos, cada qual poderá manter a escrita que, por costume ou registro legal, adote na assinatura do seu nome. | Arquiirmandade do Espírito Santo MacroEngenharia e Infra-Estrutura Ltda. Projetos e Idéias Ltda. | |
Com o mesmo fim, pode manter-se a grafia original de quaisquer firmas comerciais, nomes de sociedades, marcas e títulos que estejam inscritos em registro público. (Aqui se incluem os nomes das nossas cidades) | Cananéia - SP | |
Pompéia - SP | ||
Bairro Lindóia (Curitiba-PR) | ||
Lindóia do Sul - SC | ||
Jóia - RS | ||
Diferente é o caso de nomes de países e lugares que não são originais da língua portuguesa e sofreram tradução: | Coreia do Norte, Coreia do Sul, Eritreia e | |
Pompeia (Itália) | ||
* Maria Tereza de Queiroz Piacentini, diretora do Instituto Euclides da Cunha e autora dos livros: "Só Vírgula", "Não Tropece na Redação" e "Manual da Boa Consulta", entre outros. | ||